SEAMUS - SOUNDS OF THE CITY YOU LOVE
[Texto e fotos por Regis Vernissage]
O Blog Bequadro Mostarda estréia aqui sua primeira coluna chamada FAIXA-A-FAIXA que tem como intuito comentar CDs de bandas independentes de cabo a rabo. Para estrear com chave de ouro nada mais justo que falar sobre a primeira obra completa do Seamus, banda de Taubaté & Pinda e também integrante do coletivo Bequadro Mostarda, que lançou em Fevereiro de 2010 o grande Sounds Of The City You Love, gravado, mixado e masterizado entre Fevereiro de 2006 e Agosto de 2009 por Luiz Kalil no Estúdio Alive em Pinda, com fotos de Paulo Borgia e artwork de Luis Naressi, também guitarrista da banda, que se completa com Fernando Lalli (voz/guitarras), Pedro Fusco (baixo) e José Ronconi (bateria).
Tudo começa com Brilliant Lights, Brilliant Stars que já demonstra logo de cara ecos de Sonic Youth fase “A Thousand Leaves” em guitarras harmônicas e dissonantes que remetem a uma dimensão noventista com classe e elegância agregadas a uma cozinha onde a clamaria melodiosa se une com a voz lamuriosa de Fernando Lalli, o qual aqui canta belamente sobre um tipo de desilusão amorosa que pode parecer bem familiar para os mais atentos. Sem pausa para respirar (o que vale para o cd inteiro, sendo que é bom citar que a obra segue o conceito de não possuir intervalos entre as faixas, que são T.O.D.A.S. perfeitamente costuradas com o maior esmero), nossos ouvidos são presenteados com o que eu arriscaria chamar de a primeira porrada “bittersweet shoegazering” do cd, a sensacional Half-Less Love, que tem um arranjo rasgado de riffs potentes e teclados etéreos (as teclas são executadas no disco pelo convidado especial e “enfant terrible” Danilo Sevali do ótimo Hierofante Púrpura), agregados a uma incrível melodia vocal que casa com perfeição ao modus operandis desta pequena pérola da cidade que amamos. "But we should know there’s no half-less love at all", diria Lalli. E como parecendo um agradecimento, temos a velha conhecida Thank You, Silence, outra belíssima melodia em forma de canção que faz um paralelo conciso da ironia do agradecimento de vidas que foram ontem vividas laconicamente e da calmaria (irônica, claro) que hoje isso tudo proporcionou. Destaque para a linha de baixo do ótimo Pedro Fusco. Peguemos então nossos assentos para aproveitar o show.
“I want to remain clear: for having underestimated you, I deserve all this suffering”, é o que começa dissertanto a voz robótica do que eu arriscaria chamar de segundo petardo “bittersweet shoegazering” da obra que carrega consigo a graça de A Year Without Breathing, uma música sobre o desespero em busca do conforto para justificar a vergonha da verdade negada e perdida que poderia simbolizar-se aqui como uma lágrima caída dos olhos de seu parceiro, mas que você não havia visto até que lhe contassem, denotando a subestima. Um assunto complicado tratado com maestria por Lalli que além de jornalista demonstra ser um ótimo letrista. E mesmo os não letrados em inglês conseguem sentir todo esse desespero através da própria música que é conduzida primorosamente pelos arranjos das guitarras em “crescendo” de Luis Naressi, do baixo preciso, harmonioso e complexo de Pedro Fusco e da batera constante e tensa de José Ronconi. Temos então a versão definitiva para um grande clássico do Seamus, Blame, que foi a primeira música do primeiro EP demo da banda lá no longínquo ano de 2004. Por se tratar de um clássico, interessante notar como essa versão foi acelerada em comparação à anterior, o que acabou por valorizar o trabalho “noisy” das guitarras de Naressi & Lalli, remetendo ao melhor do pós-punk dos 80’s. Bom deixar claro aqui que me refiro a Blame como um clássico por ser uma música completamente atemporal que é cantada a plenos pulmões pela gurizada em qualquer show do Seamus que você tiver a sorte de testemunhar. Aqui ela termina em alta classe com ruídos provindos da guita do Sr. Luis “Meteoro” Naressi e num quase-solo batucante-repicado da batera de Zé Ronconi, que aproveita o descaso de nossos ouvidos ao pensar que o clássico finalizara-se, costurando sem vincos a porrada definitiva do “bittersweet shoegazering” que responde pela alcunha de Hate Campaign, um quase-punk nervosão e absurdamente rasgado como se fosse a última fenda que se abriu naquele jeans velho, sujo e contaminado pelas substâncias vividas pelo tempo. A letra traz na bandeja um personagem imaturo que precisa de “todas as respostas” e que é propenso a acreditar em qualquer mentira e besteira que ouve, seja de seu interlocutor, seja de um programa de TV voltado às massas, daqueles que vendem violência. Por acaso alguém aí não conhece alguém assim?
Acalmando a situação em sua reta final, o belíssimo piano de Danilo Sevali traz, como se fosse o prêmio final após uma dificultosa captura em um poço escuro, o arpejo do solo constante de Luis Naressi que flutua por toda a também belíssima In These Days que casa harmonia, ruídos, batera em marcha e uma clara demonstração de bom gosto melódico em sua composição. Ouvi-la atentamente nos leva a questionar o que faríamos se alguém quebrasse nossa máquina de voar justamente na hora em que começássemos a sonhar? Ou foi apenas uma interferência de rádio? Na mesma frequência, This Masquerade Ball, que talvez seja a mais radiofônica do cd devido à bela e acessível melodia de seu curto refrão, busca trazer uma paz de espírito e redenção em sua composição e mostra uma imagem ao mesmo tempo estranha e errônea daquilo que talvez pensássemos ser o certo. Algo como se tornar vidro frente à perda. Gélido. É a ponte certa para o petardo final desta obra que levou três anos e meio para ser concluída: Experiences With Broken Glass, outro tema rasgado de muitas e muitas guitarras, baixão e batera mútuos em êxtase, efeitos dilacerantes e uma boa dose de desespero contido que se divide em seus quase 10 minutos em duas partes: Part I: The Victim onde Lalli faz um mea-culpa após lembrar-se de que por onde andava, tudo que fazia, remetia à pessoa amada, por isso puni-se, angustiado, andando em vidros quebrados e Part II: Sounds Of The City You Love, continuação instrumental natural da primeira parte, porém mais lisérgica, viageira, que conta também com a mesma voz robótica de A Year Without Breathing, sintetizando assim e fechando o conceito desta belíssima, genuína e original obra de arte que não pertence à Pindamonhangaba, Taubaté, Mogi das Cruzes nem São Paulo. Pertence ao mundo!
http://www.myspace.com/sseamus
http://www.fotolog.com/_seamus
Obriagdo, obrigado e obrigado. =)
ResponderExcluirÓtimo texto! Lindo disco! (Andrea)
ResponderExcluir"A Year Without Breathing" é uma das coisas mais tristes e bonitas que ouvi nos últimos tempos. Impecável.
ResponderExcluirCris